Escreve-se não para explicar, mas para entender

Por Michele Müller

Luis Henri-de Rudder para Notre Dame de Paris, de Victor Hugo

O ato de escrever permite, ao mesmo tempo, a comunicação das infinitas narrativas construídas pela consciência e o acesso a esses mundos interiores. Nesse diálogo consigo mesmo e com mentes deste e de outros tempos vamos nos descobrindo em meio a contradições e desconstruções de uma maneira que só a busca pelas palavras perfeitas torna possível.

A escrita nos convida, conforme coloca a francesa George Sand em seu Diário Íntimo, a “sorver nosso oceano gota por gota, com receio de atravessar a nado”.

Oliver Sacks, em conversa com seu companheiro Bill Hayes, revelou que o amor à escrita nada mais é que o amor pela reflexão – “o fluxo do pensamento, novas conexões sendo feitas”. Para Clarice Lispector, é uma forma de acessar as informações assentadas na esfera da intuição.

“Minhas intuições se tornam mais claras ao esforço de transpô-las em palavras. É neste sentido, pois, que escrever me é uma necessidade. De um lado, porque escrever é um modo de não mentir o sentimento (a transfiguração involuntária da imaginação é apenas um modo de chegar); de outro, escrevo pela incapacidade de entender, sem ser através do processo de escrever”.

Revelar-se pela escrita de forma inevitavelmente sincera, como ela coloca, sempre representa certo risco: de se descobrir e se mostrar vulnerável, de não se fazer entender, de faltar clareza, de se contradizer. A disposição em assumir esses riscos revela um senso de aventura que é, para ela, a “aproximação mais isenta e real em relação a viver”.

“Respeito uma certa clareza peculiar ao mistério natural, não substituível por clareza outra nenhuma. E também porque acredito que a coisa se esclarece sozinha com o tempo: assim como num copo d’água, uma vez depositado no fundo o que quer que seja, a água fica clara. Se jamais a água ficar limpa, pior pra mim. Aceito o risco”.

Clarice Lispector em De Escrita e Vida

 

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