Por que devemos estimular a curiosidade e incentivar o erro
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2 novembro, 2020

Por que devemos estimular a curiosidade e incentivar o erro

Educação ativa não é questão de estilo, mas de respeito ao potencial do cérebro para aprendizagem.
[caption id="attachment_1407" align="alignright" width="229"] Phil May (Phil May´s ABC, 1897)[/caption]
    O cérebro é uma máquina de fazer previsões. Com base nas experiências anteriores, prevê o que vai acontecer o tempo todo. Assim, o ambiente ao nosso redor vai nos ensinando a tomar decisões seguras. Quando a previsão está errada, ele precisa acomodar uma nova informação, uma nova possibilidade, e com isso forma conexões, transformando-se um pouquinho a cada descoberta. Se tudo ocorre conforme o previsto, o cérebro não precisa mudar, ou seja, não aprende. Como crianças têm poucas experiências, suas previsões estão constantemente erradas e precisam ser reavaliadas. Da forma como um adulto irá responder a uma manha à probabilidade de um objeto caber em um espaço, descobrem como o mundo funciona por meio de tentativas e erros. Os erros, portanto, são parte fundamental da aprendizagem e só se transformam em um problema quando são censurados. Como seria se um bebê, ao aprender a andar, fosse reprimido cada vez que caísse? O processo cognitivo funciona a partir do mesmo princípio, em qualquer idade. Há outro aspecto fundamental da aprendizagem: o interesse. Sem motivação, o cérebro não fica receptivo à mudança. Isso significa que, para que ocorra a transformação pela qual ele passa quando aprende, conta com a ação de uma série de neurotransmissores que otimizam esse processo. Essa combinação química está correlacionada a três motivadores que costumam não estar presentes nas tradicionais aulas expositivas: a necessidade, a curiosidade e a socialização. Mesmo sem ter nenhuma informação sobre o que acontece no cérebro quando aprendemos, antigos gregos já haviam percebido o papel desses componentes na aquisição de conhecimento. Por isso, consideravam que o nível mais alto de aprendizagem, onde ela ocorre melhor, é atingido quando o aluno está engajado e motivado. Entregar uma série de informações de forma direta, sem antes despertar a curiosidade e sem violar nenhuma expectativa, é desperdiçar o potencial de aprendizagem da criança. Uma parte muito pequena da informação, quando muito, é absorvida por quem escuta passivamente, sem ser desafiado, sem errar. Estimular a curiosidade é o papel mais importante do educador. É a habilidade que gera energia para que todas as outras sejam exercitadas. Por isso, um sistema eficaz investe uma boa parcela de seus recursos neste componente, principal ferramenta na construção da capacidade de buscar e filtrar as informações com autonomia ao longo de toda a vida. Isso faz mais que trazer sentido para a aprendizagem: traz sentido para a vida. Poucos colocaram essa questão de forma tão eloquente quanto Eleanor Roosevelt em seu livro You Learn By Living: “Quando para de aprender, você para de viver de forma significativa. Afinal, o propósito da vida é experimentar ao máximo, alcançar com vontade e sem medo novas e enriquecedoras experiências. E isso só pode ser feito quando você tem curiosidade”. Junto com a curiosidade, ela destaca, estão interesse, a imaginação e o senso de aventura – que nada mais é que a coragem de buscar o novo, com todos os riscos que ele traz –, habilidades que tornam “qualquer aprendizagem gratificante, a vida saborosa e nos faz buscar constantemente por novidades e maior compreensão”. E completa: “São qualidades que nos fazem crescer como seres humanos até o último dia da nossa vida”. Quando respeitamos os aspectos fundamentais do desenvolvimento cognitivo – o erro, o interesse e a socialização – oferecemos o que hoje conhecemos como educação ativa. Neste sistema, as crianças participam do processo de aprendizagem sendo desafiadas a pensar, errar, criar, comunicar-se, pesquisar e ensinar os outros, sempre movidas pelo seu combustível natural, que é o interesse. Por sorte, a fonte desta energia é inesgotável e está em todos os lugares: a boa pergunta. Perguntas desafiam, intrigam, fazem pensar. Alimentam a curiosidade e o interesse, fazem o cérebro crescer. Perguntar antes de entregar a resposta é como pré-aquecer o forno antes de assar o pão: prepara o cérebro para receber a informação e chegar a um resultado melhor. E não apenas a busca por respostas deve ser encorajada, mas a busca por mais perguntas, das mais simples àquelas que ninguém tem a resposta. São elas que despertam o fascínio pela descoberta e o prazer de termos nas previsões não cumpridas e nossos modelos mentais desconstruídos. A educação estimulante é a que nos faz apaixonar pelas dúvidas e não pelas certezas. fontes: ROOSEVELT, Eleanor. You Learn By Living. E-book ed. HaperCollings. 2011 Leia também: Para ganhar uma habilidade não basta observar: é preciso partir, testar, errar e repetir Estratégias da comunicação social podem tornar a educação mais eficaz O ensino deve se adaptar à revolução da informação